Depoimentos de delatores da Odebrecht e materiais entregues como prova ao Ministério Público Federal contêm erros factuais, contradições e inconsistências.
Políticos ouvidos pela reportagem afirmaram que usarão essas brechas em suas defesas perante a Justiça.
Um ministro do Supremo disse, sob condição de anonimato, que incongruências fragilizam as acusações e que algumas delações terão de ser reanalisadas em órgãos judiciais colegiados.
Segundo ele, “não se pode provar com probabilidades. Prova tem que ser cabal”.
Peças que foram acolhidas pelo ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no STF, apresentam guerras de versões. As petições contra os governadores do PSDB Marconi Perillo (Goiás) e Geraldo Alckmin (São Paulo) são exemplos disso.
A petição contra o goiano é embasada em quatro delatores que apresentaram três versões distintas. Um deles falou em caixa dois sem apresentar documento para corroborar a acusação.
No caso do paulista, os delatores que fundamentam a petição citam números que contradizem eles próprios: o que está nas planilhas não coincide com seus relatos.
Casos comparáveis ocorrem nas citações a Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, ex-diretor da Dersa (delatores falaram em repasses de valores diferentes), e do ministro Aloysio Nunes Ferreira (divergência de datas).
Já a petição contra os petistas Aloizio Mercadante e Edinho Silva a respeito da campanha ao governo de SP em 2010 é baseada em delações que, além de terem números divergentes, contradizem-se.
Um delator, Benedicto Junior, ex-presidente da construtora Odebrecht, afirma que não teve contato com o então candidato petista, Mercadante, e que o pedido de doação via caixa dois chegou por meio de Carlos Armando Paschoal, então diretor da Odebrecht em São Paulo.
Na versão de Junior, Paschoal teria sido procurado por Silva, apontado como o tesoureiro da campanha –função que não exerceu; ele era coordenador político.
Segundo o ex-presidente da construtora, Paschoal e Silva teriam acertado doação de R$ 1 milhão, mas que foram pagos efetivamente R$ 750 mil. “O Carlos entende que o último pagamento não aconteceu por algum motivo que ele não sabe explicar.”
Paschoal, por sua vez, disse que “foram feitos três pagamentos, de R$ 250 [mil], de R$ 500 [mil] e R$ 250 [mil]”. Mas, segundo ele, a doação foi negociada por seu superior. “Benedicto me disse que estava vindo de uma reunião com Mercadante e que havia combinado que a Odebrecht faria uma doação de caixa dois para o candidato no valor de R$ 1 milhão”, relatou.
PEÇAS
Em outros casos, as incongruências estão entre o que delatores afirmaram e o que a Procuradoria apresentou.
O inquérito solicitado pela PGR contra Celso Russomanno (PRB-SP) descreve suposta ilicitude na campanha para a Câmara em 2010, mas naquele ano o acusado disputou o governo paulista.
O delator, que não especificou que cargo Russomanno disputava, afirmou que a Odebrecht repassou via caixa dois R$ 50 mil para ele. Disse que não teve contato com o candidato, mas não soube dizer o nome nem a função da pessoa que o teria procurado.
Na peça contra o governador do Maranhão, Flavio Dino (PC do B), a PGR apontou doação de R$ 400 mil –o dobro do delatado por José Carvalho. O repasse teria sido feito em troca da defesa de um projeto de lei sobre o qual o então deputado Dino não emitiu manifestação e que foi arquivado pouco depois.
A Odebrecht disse que “é de responsabilidade da Justiça a avaliação de relatos”. A PGR não quis se manifestar.